sábado, 4 de julho de 2009

Os indivíduos coletivos: a cosmologia ameríndia


Em minhas leituras, minhas experiências vividas, meu estranhamento...lá está a simbologia, as filosofias ameríndias.

Coisas belas, as vezes estranhas... histórias densas... eis aí a narrativa densa de que me fala Geertz... tão densa que as vezes se torna turvo... dificultando a compreensão. Mas assim é que é. As explicações sobre o mundo e as coisas do mundo não são simples...

Se assim o fossem não teriamos por que nos preocupar em entendê-los... não haveriam diferentes formas de cultura e de vida humana... não haveriam religiões, estados, economia.. nada de humano haveria... os humanos criam e se recriam dentro de suas culturas e cosmologias... dentro de suas redes...

Vivemos em rede social, somos indivíduos coletivos... sempre... mas nossa sociedade - a ocidental - tenta dividir o indivísivel... as sociedades ameríndias não... elas são o coletivo e só se compreendem dessa forma. Um homem é várias coisas, tem vários espíritos, suas relações com seus pares, é um coletivo de seres aglomerados num corpo, que se divide em várias partes que só são humanas quando juntas.

Falar assim parece uma viagem... mas é assim que é...

Uma pessoa só se torna uma pessoa quanto todas as partes que compõem a personificação de seu ser na sua sociedade o compõem...

Mas, o que é isso? Como se dá isso?

Quando uma criança Guarani nasce, ela traz em si uma alma, divina... que vem de um seu antepassado. Ela é então um 'avô'.. um 'antigo' que retorna... a infância não está desvinculada da madureza. O respeito pela criança é o mesmo respeito ao ancião... ela é ele, em espírito, que retorna ao convívio.

Mas, não só, ele volta acompanhado de outros seres... de uma alma animal, que vem da mata, da natureza... e que fará dessa criança alguém diferente do ancestral que o encarna... essa alma é terrena, mas também ocupa o corpo desse pequeno ser...mora nele e lhe dá as características físicas e personalidade... essa alma tem de ser domada pelos pais da criança, e pelos rezadores da comunidade...

Mas, não acaba aí esse ser coletivo... outros espíritos povoam esse corpinho... espíritos bons e maus, que podem ficar ou devem ser mandados embora....todos esses seres ligam essa criança ao cosmo... a natureza, aos rios e matas...

Os pais se protegem e protegem a criança cuidando sua alimentação, seu comportamento diante da comunidade... pois seus atos podem desencadear desequilibrios entre os espíritos que povoam seus corpos... e isso faz mal à criança...traz 'doenças'.

Esses seres, todos coletivos, tem de encontrar a harmonia para viver. Uma harmonia com o externo e com o interno...o homem ameríndio nunca é sozinho... ele é um misto com seu próprio ser densamente povoado, e com as coisas que o rodeiam, a natureza viva, onde a humanidade também se manifesta.... tudo tem alma, tudo tem espírito...tudo é coletivo e humano... mesmo que essa humanidade se transfigure na selvageria... uma onça também tem familia, aldeia, roça, cunhado...só que vive no mundo das onças e não no mundo dos homens... só que esses mundos se tocam... e as vezes os homens virão onças e onças viram homens.

É tênue a névoa que separa os mundos...

É densa a composição das filosofias...

3 comentários:

  1. Puxa Vander...cada vez mais eu procuro um jeito de citar algumas coisas tuas na minha monografia...hehehe
    ainda não sei como a ABNT "local" iria encarar isso..hehehe
    bjs!

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  2. Vander,
    É impressionante como a gente percebe os nossos "objetos"... Eles se tornam caminhos a serem trilhados. Eu me senti de alguma forma tocada. Deu vontade até de trilhar esse caminho, só pra se embretar na beleza dessas brumas!!!
    Acho que é essa capacidade de transformar nossos "obejtos" (detesto esse nome, rsrsrs) em algo que toca que faz o pulo do gato!
    beijoca!!!

    PS: se quiser faço recorta e cola pra ti, rsrsrs!!!

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  3. pronto!!! ta aqui o que eu precisava...um texto descontraído, sem frescuras acadêmicas chamando todos os pensadores. Grande VANDER, uma flor de miosótis! Nosso encontro foi rápido mas a gente há de encontrar novamente. Grande beijo querida.

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