terça-feira, 10 de maio de 2011

Rompendo os aramados que separam as fronteiras.....


Pois então, este texto é para me dar uma luz. Preciso de uma luz urgente para escrever sobre o ingresso dos estudantes indígenas na universidade. Mas, lembrando bem, não basta apenas dar possibilidades de ingressar, tem de haver recursos, condições favoráveis à permanência e bom aproveitamento dos cursos que estes meninos e meninas escolheram para mudarem suas vidas. E aí está a questão mais difícil de lidar: a mudança. A mudança de cidade, de estilo de vida, de amigos, de estrutura emocional. Essas pessoas saem de um mundo muito diferente do mundo vivido pela academia. Lá, nas suas aldeias, com suas familias, seus amigos - seus inimigos também, infelizmente...- eles têm segurança, eles conhecem o que os cerca. Aqui na academia não, é tudo novo, tudo diferente.... É exigido um comportamento 'aceitável' nas salas de aula, nos corredores, no bar... seu jeito simples, seu sorriso largo, sua fala calma se torna um motivo para a desconfiança dos colegas, professores e demais viventes que circulam nas academias da vida... Porque? Porque são índios. Essa marca que os torna diferentes e distantes dos demais cidadãos brasileiros. Mas, será que eles são tão diferentes assim? Será que porque falam uma lingua diferente do português quando estão em seus grupos eles não são tão iguais a mim ou a vocês que estão lendo este texto? Eles também falam nosso português, e muitas vezes, falam outros idiomas ameríndios também.... são poliglotas, portanto, e com certeza, falam mais linguas do que eu que escrevo essas linhas. No entanto, há quem os rotule de 'incapazes', pouco inteligentes, negligentes como estudantes... e outras coisas mais, para descaracterizar o seu direito de estar frequentando os bancos academicos no mesmo pé de igualdade que qualquer outro aluno de curso superior. Dificuldades? Ah, sim, eles tem muitas. Principalmente aqueles alunos que se aventuram pelas áreas da saúde, como cursos de medicina e enfermagem. Mas, pergunto: quem no primeiro ano de medicina não tem dificuldades com os termos, com a quantidade de leituras? O fato desses estudantes virem, na sua maioria, de uma escola pública, muitas vezes precária - pois as escolas indígenas não são bem estruturadas para dar suporte ao modelo que temos no ensino superior - não é levado em conta quando professores os classificam como alunos inferiores aos outros na sala de aula. Os estudantes indígenas vem pra Universidade com outras perspectivas, que não são as mesmas dos estudantes não-índios. A realidade deles é muito diferente da que um garoto ou garota que viveu na cidade sua vida inteira, que teve pais que os colocaram em bons colégios, e até fizeram cursinho pré-ENEN / Vestibular para ingressarem na universidade. Essas pessoas, muitas vezes vem de lugares bastante distantes das cidades. Tem, da mesma forma, uma trajetória de dificuldades financieras e psicológicas que o afastam do 'lugar-comum' do estudante universitário, já que essa realidade só está se apresentando para essas pessoas a muito pouco tempo. As noções e necessidades que trazem esses alunos para a universidade são tão diversas das que trazem os tradicionais estudantes que já desde muito ocupam as cadeiras escolares e universitárias no Brasil. Hoje temos essa realidade: indígenas que tem direito a vagas universitárias. Mas, não era assim há alguns poucos anos atrás. Essas pessoas, corajosas, lutadoras, conhecem uma realidade brasileira bem diversa da maioria dos alunos que estão na Universidade, e que sempre estiveram lá. A realidade de professores, acadêmicos, pesquisadores, que estão lá na Universidade ocupando seus gabinetes, suas salas de pesquisa, com seus computadores e equipamentos de alta tecnologia, desconhecem a realildade de uma comunidade indígena, com suas hortas, seus animais, sua mata, sua vida livre, porém com seus problemas, suas angústias, suas recusas... Pois, falamos aqui de pessoas que conhecem uma vida muito mais real do que muitos desses professores, falamos aqui de gente que já sofreu expulsão de suas terras, fome, exclusão, preconceitos de vários tipos. Essa gente brava, vem há mais de 500 anos defendendo seus direitos, sua identidade, sua terra, e só agora lhes é concedido o direito de estudarem as tecnologias dos 'brancos'. E essa tecnologia, essa ciência acadêmica vai ser colocada a disposição das suas comunidades. Nenhum aluno indígena vem pra universidade pensando somente nele, eles vem pensando em suas familias, em sua comunidade, em retornar com conhecimento a mais para ajudar lá na aldeia, ajudar nas demandas que se fazem tão necessárias e urgentes para melhorar a vida daquelas pessoas que os estão esperando para realizar coisas boas para eles. Os povos indígenas sempre foram denegridos pela história brasileira, que os apresentou como secundários e pouco ativos na formação de toda essa nação. Hoje eles vem reinvindicar seu lugar nessa história, e ocupar os lugares que lhes cabe na sociedade brasileira. Mas, o preconceito permanece muito enraizado, e os olhares sobre essas pessoas ainda os marginaliza, ainda os coloca numa patamar inferiorizado diante daquilo que é visto como o 'ser brasileiro, ser cidadão'. As ciências e conhecimentos de seus ancestrais, que ainda são utilizados e resolvem seus problemas nas suas terras - muitas vezes com mais eficácia do que muitos projetos cinetíficos implementados pelo Governo e que não dão bons resultados - não são reconhecidos pela academia como um tipo de 'fazer ciência', mas é visto sim como fetiches e crendices, não sendo levados à sério pelos notórios nomes da ciência acadêmica. Estes e tantos outros elementos nos levam a perceber que os estudantes indígenas que vem pra universidade tem tanto a nos ensinar quanto a aprender conosco. A questão está em o quanto estamos abertos - como eles estão - para esse novo aprendizado. Isto sim será um desafio para os cristãos - ocidentais modernos.

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