quarta-feira, 10 de novembro de 2010

QUANDO CAEM AS MÁSCARAS...


Há pessoas que passam a vida representando personagens. Em realidade, todos nós nos representamos e apresentamo-nos aos outros como algo, há, no entanto, aqueles que representam a si mesmo como outros, aqueles que usam as máscaras mais diversas para se esconderem e esconder dos outros sua própria face. Esses são os perigosos, e as vezes são perigosos pra si mesmos, pois acabam por nunca descobrirem quem realmente são, passando a vida a representar personagens e personalidades absorvidas de outros.

Há muitas pessoas assim pelo mundo, há muita gente perdida dentro de si mesma que não encontra sua face ou tem medo dela no espelho.

Vou contar uma história, um conto, uma fábula.... Nela há um Rei, nobre, belo e bondoso. Esse Rei circula pelas ruas dando atenção a todos que encontra. Ele é muito amado pelos súditos, muito querido por todos devido a sua beleza e bondade.

No entanto, por detrás da capa e da bela fisionomia do Rei, se esconde um Bufão. Este não é nobre.... Infelizmente nasceu nas ruas, foi maltratado pela vida e acabou ocupando o cargo de Bufão na corte do Rei... e aos poucos, esse Bufão, cheio de rancores pela vida dura e pelos seus traumas, ocupou o lugar do Rei, travestindo-se como Rei... O Rei verdadeiro desapareceu a tempos... ninguém sabe exatamente como nem quando... ele sumiu do castelo e nunca mais foi encontrado. Porém o Bufão, rancoroso e amargo, tomou para si as roupas do Rei, vestindo-se e comportando-se em público como o Rei. Assim, ele engana a todos, se faz passar por nobre e belo, enquanto na realidade, no escuro do quarto de dormir, ele é apenas um Bufão, torto, amargurado e mau.

Esse Rei / Bufão apresenta-se como nobre a todos, inclusive dentro da própria corte, e dessa forma ninguém sente a falta do verdadeiro Rei, pois acreditam que ele ainda está vivo, ainda está circulando entre seus súditos... Porém, o Bufão / Rei utiliza os gestos nobres para se fazer amar, utiliza das máscaras do Rei verdadeiro para se fazer belo, utiliza da capa e do cetro para impor respeito e sabedoria aos outros...

Mas, como esse Rei / Bufão, não é nobre de verdade, ele as vezes tropeça na capa e faz injustiças. Deixa a máscara cair um pouco e mostra uma carranca feia e amargurada que assusta as pessoas...

No entanto, ele cuida muito para que esses pequenos lapsos não façam com que se descubra sua verdadeira identidade, ele cuida para que ao seu lado estejam os mais nobres cavalheiros e damas da corte para que os seus súditos o vejam como bom e nobre.. Apenas, nas entranhas do seu quarto, no seu submundo, ele tira a fantasia e se olha no espelho.... E ali, sozinho, ele chora. Ele não quer ser Bufão, ele quer ser Rei...mas no seu íntimo, ele não consegue ter a nobreza do Rei verdadeiro, ele é o Bufão, ele é amargo e feio... Então, ele se põe a proteger aqueles que são como ele, amargos e feios, sujos e maus, aqueles que rastejam nas ruas e amaldiçoam àqueles que são nobres e bons... Mas, quando o Rei / Bufão protege essas criaturas, ele o faz como se esse ato o fizesse bondoso e caridoso, não por que ele se identifica com esses seres amaldiçoados... Isso é a forma como ele transfere aos seus súditos e à corte esse seu ato de cordialidade com a mais baixa ralé...

Porém, no fundo de seu coração ele sabe que esse ato não é caridade, nem bondade, ele apenas se reconhece nessas criaturas, pois é igual a eles... é feito da mesma matéria, esses seres são seus pares, são seus iguais, e entre eles, o Bufão / Rei, pode ser apenas Bufão... pode deixar de lado a nobreza fingida, a capa grande demais para o seu corpo disforme, a coroa que pesa em sua cabeça grande demais, o cetro que impõe justiça... Ali, ele se desveste, ali ele se olha como um paria... ali ele não precisa fingir, nem fugir de sua condição amaldiçoada.

Mas, ele não quer admitir que é assim... ele apenas foge de vez em quando pra seu submundo pra se sentir menos pesado...

Ele quer ser Rei, ele quer seu público, ele quer ser nobre e amado... e ele finge... e ele foge... e ele não se olha no espelho para não ter de enfrentar seu próprio rosto a luz do dia claro.

E assim, ele segue enganando, a si mesmo e aos outros que convivem com ele, que pensam e acreditam que ele é Rei e nobre, e que depositam nele sua confiança, até ele a trair, e ainda assim fazer acreditar que a sua traição foi por nobre causa, e que a razão e a justiça são sua aliadas...

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